Art. 307 – Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem:
Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.

Bem jurídico

Tutela-se, como este crime a fé pública.

Sujeitos do crime

Tipo objetivo

Identidade falsa, não é apenas a que se refere ao nome, mas qualquer circunstância que identifique o agente, como estado civil, profissão, filiação.

“O art. 307 do CP fala em identidade, ou seja, tudo o que identifica a pessoa: estado civil (filiação, idade, matrimônio, nacionalidade etc.) e condição social (profissão ou qualidade individual). Assim, pratica crime de falsa identidade quem exercita a profissão de advogado sem estar inscrito na OAB” (TRF – 1.ª Reg. – Rec. 95.01.17920-6 – Rel. Hilton Queiroz – JSTJ e RTRF 123/427).

“Incide na sanção do art. 307 do CP (falsa identidade) aquele que, intitulando-se delegado de polícia, por espírito de vingança ou capricho, prende cidadão e, fazendo uso de algemas, o conduz ao distrito policial, causando-lhe relevantes danos físicos e morais. Fato desse jaez erige-se à do crime porque constituem ‘identidade’ todos os elementos de identificação da pessoa, ou seja, seu estado civil (idade, filiação, matrimônio, nacionalidade etc.) e seu estado social (profissão ou qualidade pessoal)” (TACRIM-SP – AC 525.331-3 – Rel. Silva Pinto – RT 641/349 e RJDTACrim 2/95).

Agentes que se apresentam como fiscais da Prefeitura, recebendo de comerciantes quantias em dinheiro – Vítimas que entregaram aos acusados, soi-disant fiscais, certas importâncias, sob a promessa deles de conceder prazo extra para regularização da documentação – Comportamento descrito na denúncia constitui crime contra a fé pública, previsto no art. 307 do CP (TACRIM-SP – AC – Rel. Rocha Lima – JUTACRIM 74/348).

 “Comete o delito do art. 307 do CP aquele que se intitula falsamente oficial do Exército, com o intuito de influir no espírito do guarda que o multava por infração de trânsito” (TACRIM-SP – AC – Rel. Valentim Silva – RT 428/355).

“Atribuir-se falsa condição social, qual seja, a de funcionário federal, a fim de obter proveito indevido, induzindo outrem a erro quanto à sua pessoa, constitui o delito previsto no art. 307 do CP” (TJSP – AC – Rel. Arruda Sampaio – RT 343/126).

Para a caracterização do tipo, é desnecessário que o agente obtenha o proveito almejado, porquanto a vantagem vem descrita na lei, como elemento subjetivo do tipo, bastando que esteja presente na mente do agente. [2]

 

[2] “É pacífico que, para a condenação pelos crimes de falso, basta a potencialidade apta a enganar e a prejudicar, não sendo exigida prova do dano efetivo (Rec. 93.292-RJ, Rel. Min. Moreira Alves, RTJ 101 (1): 311, jul. 1982). A alegação de que o agente portava os documentos falsos apenas para livrar-se da ação da Justiça, sobre não constituir excludente de ilicitude, é infirmada pela sentença que atesta que o paciente fez compras em estabelecimento comercial, usando nome e identidade falsa” (STF – HC 72242-3 – Rel. Moreira Alves – DJU 02.02.1996, p. 850).

Acusado que se apresenta no estabelecimento da vítima como fiscal federal, exibindo carteira funcional pertencente a outrem – “Perfaz-se o delito de falsa identidade mesmo quando não logre o agente vantagem alguma em proveito próprio ou alheio, nem chegue a causar efetivo prejuízo, bastante sendo que a falsa atribuição tenha idoneidade para a consecução desses fins” (TJSP – AC – Rel. Des. Adriano Marrey – RF 392/118).

“Basta que a falsa atribuição tenha idoneidade para a consecução desse fim, para configurar o delito; irrelevante em proveito próprio e nem cause prejuízo à vítima” (TACRIM-SP – AC – Rel. Ricardo Couto – JUTACRIM 13/281).

Discute-se se o crime se configura quando o agente dá falsa identidade com o fim de evitar ou fugir da prisão. Há que sustente que o crime não está configurado, pois, visa o agente ocultar algo anteriormente praticado e não ter, propriamente, uma vantagem, sendo considerado exercício de autodefesa, já que o acusado não tem o dever de dizer a verdade. Há, no entanto, diversos julgados nos quais se entendeu caracterizado o crime quando o fim do agente era fugir da prisão.

Confiram-se as diversas posições na jurisprudência:

Meliantes que se hospedam em hotel com nomes trocados – Ardil utilizado para fugirem à perseguição da polícia – “O que a lei pune, no art. 307 do CP, é a atribuição de falsa identidade para a obtenção de vantagem ou para causar dano a outrem. Assim, o dano e a vantagem devem ser decorrentes, subseqüentes da falsa identidade. Se, porém, essa última circunstância é um simples processo de ocultação de um ilícito anteriormente praticado, não há que falar no crime em questão” (TACRIM-SP – AC – Rel. Barbosa Pereira – RT 306/353).

“A alegação, pelo agente preso em flagrante, de inimputabilidade penal por força de mentirosa invocação de idade inferior a 18 anos não é suficiente para caracterizar o crime de falsa identidade, pois tal conduta não tem o condão de ofender a fé pública, mas visa simplesmente o exercício de autodefesa” (TJSP – Ap. 242.213-3/9-00 – Rel. Renato Talli – j. 08.06.1998 – RT 757/541).

Agente que ao ser preso em flagrante por furto, alega ser menor – “Não se pode multiplicar até uma realização da figura do art. 307 do CP a só alegação de inimputabilidade penal por força de mentirosa invocação de idade inferior a 18 anos, uma vez que o alvo do agente autor disso não será evidentemente o de ofender a fé pública com vistas a obter vantagem em proveito próprio ou alheio, nem o de causar dano a outrem, que constitui a direção essencial do comportamento delituoso catalogado; mas simplesmente o de exercitar elementar ânimo de autodefesa, em cuja amplitude a mentira é entidade compreendida no direito de calar a verdade ante a pretensão estatal de punir” (TACRIM-SP – AC – Rel. Soares Pinto – JUTACRIM 73/384).

“A manobra defensiva, intuitiva, de alegar uma idade inferior a 18 anos para escapar ao flagrante, não atinge o bem jurídico da fé pública” (TACRIM-SP – AC 436.117-9 – Rel. Mafra Carbonieri – JUTACRIM 90/228).

“Inobstante tratar-se de questão ainda controvertida nos tribunais, a jurisprudência prevalente, inclusive desta Câmara, é no sentido de que o acusado ao declinar nome falso ao ser preso atua dentro do seu legítimo direito de autodefesa, não constituindo tal conduta infração à norma do artigo 307 do Código Penal, eis que ausente o elemento subjetivo próprio” (TJRJ – Ap. 1.003/99 – Rel. Marcus Basílio – j. 21.09.1999).

“Por exigir dolo específico, voltado para a obtenção de vantagem ilícita, a infração deixará de caracterizar-se quando o agente, com isso, visa ocultar seu passado criminoso” (TACRIM-SP – AC 416.361-8 – Rel. Emeric Levai – RT 608/352 e JUTACRIM 91/233).

“Não restando demonstrado o elemento subjetivo, cujo dolo é específico, não há que se falar em crime de falsidade ideológica, mas, sim, no delito de falsa identidade. Se o réu, ao ser preso, age em autodefesa, não comete o mencionado crime” (TJRJ – AC 688/95 – Rel. José Lucas Alves de Brito – RTJE 154/317).

“O acusado que informa falsamente a autoridade policial ou judiciária sobre sua identidade, no interrogatório, mirando obter vantagem em proveito próprio, não comete qualquer crime. A fé pública, que é a confiança pública atribuída pela lei a certas pessoas e coisas, é o bem jurídico tutelado nos crimina falsi e o acusado não tem o dever de dizer a verdade, em decorrência do princípio universal nemo tenetur se detegere” (TARJ – AC – Rel. Jorge Romeiro – RT 532/414).

“Caracteriza o crime previsto no art. 307 do CP a conduta do preso que, para obter a liberdade, passa-se por companheiro de cela beneficiado com alvará de soltura, utilizando os dados da qualificação e roupas dele e falsificando sua assinatura, uma vez que estão configurados o tipo objetivo e subjetivo do delito, e presente também a culpabilidade, pois inequivocadamente reprovável a conduta de quem, frustrando a ação da justiça, confunde a Autoridade, utiliza falsa identidade, para evitar a aplicação da lei” (TACRIM-SP – Ap. 1.166.301-7 – Rel. San Juan França – j. 14.12.1999 – RJTACrim 46/140).

“Caracteriza o delito do art. 307 do CP a conduta do agente que, com o intuito de fugir da Cadeia Pública onde estava preso, apresenta carteira de identidade fornecida por um visitante e falsifica a assinatura deste na lista de controle de visitas, uma vez que atribui a si próprio falsa identidade ao tentar passar-se por outra pessoa, sendo que a circunstância de não ter alcançado seu objetivo, tendo sido reconhecido e detido por funcionários do estabelecimento penitenciário não tem o condão de tornar o fato atípico” (TACRIM-SP – Ap. 1.032.879-3 – Rel. Teixeira de Freitas – j. 29.10.1996 – RJTACrim 34/183).

“O art. 307 do CP contempla a hipótese de alguém que, fazendo-se passar por outrem, fica detido em lugar daquele, que, aproveitando-se do erro em que mantida a autoridade policial, é posto em liberdade” (TACRIM-SP – AC – Rel. Adauto Suannes – RT 585/328).

Embora não se trate de falsidade documental, também neste crime, exige-se a idoneidade do meio empregado. Se há, na conduta do agente, emprego de meio absolutamente ineficaz para atingir o seu propósito, não há que se falar em crime.

“Não se configura o crime previsto no art. 307 do CP, se o meio empregado é inidôneo, ainda que tenha o agente a vontade premeditada de apresentar-se com falsa identidade” (TAMG – AC 18.040 – Rel. Odilon Ferreira – RF 309/240).

O crime se configura ainda que a vantagem almejada seja puramente moral, pois este é um crime contra a fé pública e não contra o patrimônio.

“Diversamente do que ocorre com o estelionato, não se faz mister, para a consumação da falsa identidade, que se realize efetivamente a vantagem ilícita em correspondência com o prejuízo alheio, nem tampouco que a vantagem ou prejuízo tenha caráter patrimonial. O proveito pode ser de ordem moral ou representar qualquer outra utilidade não econômica” (TACRIM-SP – 3.ª C. – AP 335.747-8 – Rel. J. L. Oliveira – j. 05.06.84 – JUTACRIM 79/414).

“O delito do art. 307 do CP somente existe, quando o agente se inculca como pessoa diversa ou quando atribui a outrem falsa personalidade. As condições de estado civil e outras que não impliquem substituição de individualidade, considerada como personalidade, não são objeto da repressão contida nesse dispositivo” (TJSP – AC – Rel. Dantas de Freitas – RT 252/132).

“O delito do art. 307 do CP somente existe, quando o agente se inculca como pessoa diversa ou quando atribui a outrem falsa personalidade. As condições de estado civil e outras que não impliquem substituição de individualidade, considerada como personalidade, não são objeto da repressão contida nesse dispositivo” (TJSP – AC – Rel. Dantas de Freitas – RT 252/132).

 

Certo, porém, que não se configura o crime se o agente atribui-se elementos falsos por pura bazófia ou relés vaidade.

“Desde que vise tão-somente a vantagens pessoais intransmissíveis, sem irrogar prejuízos à fé pública, não se tipifica como crime a falsa atribuição de identidade” (TARS – AC 287046866 – Rel. João Andrades Carvalho – JTARS 64/122).

Tipo subjetivo

O tipo exige o dolo, inexistindo forma culposa.

Além do dolo, imprescindível o elemento subjetivo do tipo, consistente no fim de obter a vantagem, ou de causar dano a alguém.

Tratando-se de elemento subjetivo do tipo, não é necessário que o agente atinja seu escopo, bastando que esteja o fato presente em sua consciência no momento em que atribuiu-se a falsa identidade

Iter criminis

  • Consumação
    • Com a atribuição da falsa identidade
    • Independe de eventual vantagem
  • Tentativa
    • Possível, embora de difícil configuração
      • Plurissubsistente
        • Atos univocos

Questões especiais

  • Falsa atribuição de funcionário público
    • Art. 45, LCP
    • Art. 46, LCP – uniforme
  • Usurpação de função pública
    • Art. 328, CP

Crime subsidiário 

  • Estelionato (art. 171)
    • “O crime de falsa identidade é eminentemente subsidiário e perde sua autonomia quando funcione como meio fraudulento para a prática de estelionato” (TACRIM-SP – AC – Rel. Weiss de Andrade – JUTACRIM 60/255).
  • Falsificação material de documento público (art. 297)
    • Falsificação de documento público. Desclassificação para falsa identidade. Inadmissibilidade. Norma do art. 307 do CP que é subsidiária àquela prevista no art. 297 do mesmo Estatuto (TJSP – 1.ª C. – AP 477.321-3/0-00 – Rel. Marco Nahum – j. 21.02.2005 – RT 836/543).
  • Fraude processual (art. 347)
    • Acusado que se apresenta à polícia, em lugar do irmão, para fornecer material grafotécnico no inquérito instaurado contra aquele – Ardil grosseiro e desde logo percebido – Inteligência dos arts. 307 e 347 do CP – “Inovar artificiosamente o estado de lugar, coisa ou pessoa, significa provocar em lugar, coisa ou pessoa modificações materiais, extrínsecas ou intrínsecas, de forma a alterar o aspecto ou outra propriedade probatória que o lugar, coisa ou pessoa tinha precedentemente, e idôneas para induzir o juiz ou perito, como preleciona Heleno Cláudio Fragoso (Lições,4.º/1.036/7).
  • Uso de documento falso (art. 304)
    • “Se o agente mesmo ciente da falsidade do documento público utiliza-o, comete o crime previsto no art. 304 do CP, não havendo que falar em desclassificação para o crime de falsa identidade, previsto no art. 307, também do CP” (TJPR – 1.ª C. – AP 64.007-3 – Rel. Clotário Portugal Neto – j. 26.03.98 – RT 759/687).